segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

A Privação e a Compulsão - Parte I

Essa é apenas a reprodução de uma história frequentemente contada nos círculos de conversa que ocorrem nos "Comedores de Pele de Galinha Frita Anônimos" (CPGFA), uma organização que visa à auxiliar os portadores desse terrível e insalubre vício. É uma história sobre os meios que acabam levando a essa compulsão irremediável...

Tudo começou num santo almoço dominical após a tradicional missa rezada na pequena igreja do vilarejo onde Ramón, o gordo, nasceu e cresceu – e cresceu muito. Para ser mais exato, tudo começou com pele de galinha frita.
Ramón, como era conhecido na época, sempre fora um rapaz religioso e introvertido. Sua conversa com as mulheres não era menos monótona do que seu tom de voz enquanto orava. Os papos iam da saúde do pároco ao tempo para a próxima semana. Se o assunto pendesse para os seus sentimentos em relação às mulheres, a reação era instantânea: tinha uma reunião marcada com o Padre Décio Vital. Se fosse buscar o pão de cada dia no boteco do outro lado da rua e um qualquer perdido no mundo o convidasse para sentar, tomar uma que “matou o guarda” e jogar um carteado, explicava que seu tempo estava ocupado com os céus e precisava ir à escola ensinar os cegos a ler a bíblia em braile. Se perguntassem a ele se participaria do jogo de futebol de natal entre os moradores da vila, dizia estar ocupado com o presépio. Afastava-se de tudo o que era dos homens imaginando estar assim alcançando o firmamento. E, claro, os compromissos terrenos que usava como desculpa para esquivar-se do mundo eram tão verdadeiros quanto o interesse das mulheres em suas conversas.
Nem sempre fora religioso com tal fervor. Como todo mundo, nasceu cheio de dúvidas. Mal tinha pensado nelas quando ficou cheio de certezas, que vieram após o trauma da masturbação. Ouviu falar nela numa manhã no colégio e, chegando em casa, almoçou rapidamente e foi tentar pela primeira vez o pecado. Escondeu-se no banheiro da avó, o lugar menos frequentado da casa, que só era por ela usado para trocar as fraldas antes de dormir. Contudo, o inesperado aconteceu e naquele início de tarde a avó de Ramón quis, de forma inédita nos últimos quinze anos, limpar a dentadura após o almoço. Vinha a anciã com os lábios vacilantes e a dentadura cheia de gordura escorregando das mãos. Já nas mãos de Ramón o que escorregava era outra coisa. A velha girou a maçaneta e os seus olhos opacos pela catarata não tardaram um segundo em reconhecer a barbaridade. Deixou a dentadura cair e quebrar-se no chão ao mesmo tempo que gritou: “Cristo-Rei!”. Rapidamente a família veio acudir a idosa, que estremecia e pronunciava palavras incompreensíveis, não se fazendo entender menos pela ausência dos dentes do que pelo descomunal espanto causado pelo pecado que acabara acidentalmente de ser testemunha. De fato, não sabemos se tal choque provém da novidade ou da aversão à observação do gesto, mas, para fins práticos, a anciã do lar passou a alimentar-se de mingau, lambuzando toda a boca como se, distraída, pensasse em outra coisa enquanto comia.

(A parte II vem em breve, apenas p/ não ficar muito extenso)

sábado, 5 de setembro de 2009

Qualquer Estória em Qualquer Tempo em Qualquer Lugar

Era uma noite de lua cheia, tão cheia e inquiridora que não parecia lua, mas sim um olhar de ave de rapina, solitário, calculista e plácido, tudo ao mesmo tempo. As estrelas fugiam do brilho ofuscante do satélite natural terrestre, podendo só serem vistas a meio caminho entre o ápice celeste e o obscuro horizonte, que a oeste se terminava no mar distante e a leste penetrava num mundo insondável escondido por montanhas de pedras e de especulações. Aqueles que habitavam a margem oeste do rio furioso e silencioso, que trazia o encanto da serra, se perguntavam sobre o universo que haveria do outro lado das águas, que subia aos céus pelas encostas íngremes e se derramava entre picos e vales a perder de vista. Seria o inferno ou o céu que naquelas montanhas havia? O mundo dos nossos sonhos ali ocorria? Deus dali procedia?
Nas poucas gerações que se passaram naquele vilarejo esquecido pela história humana, sempre questionava-se o porquê de as águas do rio correrem sempre para o mar. Diante de vidas tão inconstantes marcadas por tragédias e glórias, os aldeões espantavam-se com a constância daquele curso hídrico cristalino que errava entre pedras e entre vilas de seres perdidos num mundo incerto e isolado. Naquela comunidade ribeirinha, imaginava-se que deveria haver vida humana em algum outro lugar, pois os urubus que para ali pairavam nos dias de céu azul e tórrido pareciam já ter um conhecimento prévio de como anunciar a morte, de forma que se achava que após levar a miséria a algum outro vilarejo ali estavam aquelas aves negras para disseminar um pavor silencioso que só acabava quando algum pobre coitado tinha seu cadáver cuidadosamente devorado por esses informantes da má-sorte. Não havia nenhuma evidência melhor de que haveria mais algum humano a viver por aquele mundo.
Agora, não viviam ali mais do que quarenta pobres almas, perdidas na incerteza geográfica e filosófica da existência. Ninguém havia pedido para nascer, não tendo ninguém qualquer plano para a vida. Simplesmente viviam, com a mesma contemplação monótona com que observavam o contínuo fluxo de água que se movia das montanhas para o mar. Aquela realidade sem sentido parecia um sonho inventado desde a primeira memória que vinha à mente, já que ninguém se lembrava do que ocorrera do nascimento até tal recordação. E, cada um com seu próprio sonho lúcido, passava os dias alheio aos outros aldeões, sendo que cada pessoa naquele lugar insólito no meio do nada parecia mais uma vila de um habitante só perdida num deserto insondável e inimaginavelmente distante de qualquer sinal de vida. Para cada situação, inventava-se um diálogo diferente, pois com o tempo não consumara-se um idioma naquele povoado. De acordo com as situações, as coisas ganhavam nomes diferentes, mudando também os seus valores. O próprio chão de terra e pedregulhos era uma coisa duvidosa, que em tempos de chuva era disputado a pedradas devido às plantas sem sabor mas que saciavam a fome que ali brotavam, enquanto em tempos de morte as famílias fugiam para as pedras mais altas ou para o interior de suas casas para evitar entrar em contato com aquela terra que era o berço final dos homens que ali tombavam e eram devorados por urubus, tendo seu corpo despedaçado e sua carne cadavérica misturada à poeira marrom seca e amarga. As coisas viviam num ciclo interminável de glória e desvalorização. As únicas coisas constantes naquele lugar eram a solidão dos seres, o isolamento do povoado e o curso do riacho.

(Continua de qualquer jeito em outro momento)

sábado, 11 de julho de 2009

A Tristeza das Coisas

Um velho brinquedo, simples, de plástico ou madeira, guardado por vinte anos nas profundezas de um esquecido baú, esquecido pela vida que seguiu e pela infância que se foi. Basta vê-lo para surgir um aperto na garganta. Dá uma vontade de chorar de tanta tristeza. Aquilo foi um mundo que já não é mais, quem sabe foi até um sonho que não vingou. O brinquedo lembra uma manhã de sábado luminosa, de início de verão, permeada por brincadeiras, imaginação e liberdade. O mundo todo era um mistério a ser descoberto e as coisas tinham a sua própria essência.

A manhã de sábado passou e o brinquedo, sem ninguém perceber, desapareceu. Ele ficou esperando, sem sentimento, alguém que no futuro talvez fosse resgatá-lo. Foi acumulando poeira, assim como tristeza. Não para si, mas para quem fosse pegá-lo. E ocorreu que quando alguém, décadas depois, feito um homem despedaçado, decidiu dar um fim ao ancião baú, deu-se o encontro inesperado do velho brinquedinho. Foi tanta coisa que aconteceu, muita coisa nova que uma criança inocente nem sonha, que é difícil montar um curta-metragem da vida. Porém, pensando um pouco, tudo condensado não parece superar em felicidade as brincadeiras daquela manhã em que esse pequenino objeto inanimado viveu seu esplendor. “Por quê?”, perguntava-se o soturno ser que fitava entre lágrimas aquele pequeno túnel do tempo. E, quando olhou ao redor, viu que tudo o que havia em seu mundo banhava-se no mesmo triste sentimento. Tudo estava sujeito à ação implacável do tempo. Tudo estava fadado ao esquecimento. Tudo o que montamos para vivermos nossa vida parece menos eterno do que a felicidade de se divertir com aquele anacrônico brinquedinho. As coisas, nesse transcorrer dos anos, perderam sua maior preciosidade, que é o ser individual. Agora, o homem viu que tudo o que ele via era uma extensão do seu ser. Ele aprendeu o que sentir e o que pensar quando via flores, houvia música, lia livros, conversava com amigos e amava as mulheres. E, assim, o mundo havia perdido a novidade. Hoje, ele sabe exatamente do que o brinquedo é ou não capaz. Quando criança, experimentava para saber, e, não raramente, surpreendia-se com o que o universo lhe ensinava. Sempre amou o conhecimento e sempre o buscou, mas hoje parece que o que sabe o impede de reaprender. Parece que colou em todas as coisas do mundo o mínimo que sabe sobre ele.

“A tristeza das coisas é a nossa própria tristeza. Ela vem quando colocamos certezas sobre o que as coisas são. Isso não quer dizer que é um pecado buscar o conhecimento. Do contrário, é a isso que dedicamos nossas vidas, desde quando nascemos. O desgosto vem da insolência do modo como tratamos as coisas, como se fôssemos os criadores do universo. O prazer da vida vem da qualidade de apreciadores e de inquiridores da natureza, de descobrirmos os seus mais preciosos segredos cheios de estupefação, assim como faz a criança quando desbrava o mundo misterioso... “, pensou o homem enquanto admirava o brinquedo e tudo o mais o que presenciava ao seu redor. Respirou fundo, sentiu a obscuridade da falta de saber e da arrogância de quem crê tê-lo por completo, e espirrou após inalar a poeira acumulada naquele ambiente, por tanto tempo posto à margem da realidade, dissipando-a da superfície do brinquedo. Percebeu como as marcas da passagem do tempo podem mexer com o ser humano e como coisas tão espontâneas quanto um espirro podem limpar a sujeira que vamos acumulando com os anos.

terça-feira, 30 de junho de 2009

Por que "Uma História Pessoal"?

Diante da infinita possibilidade de escolha para um nome para este blog, é sempre bom explicitar o que fez com que eu escolhesse esse em particular. É fácil recordarmos nossas indagações quando nos perguntamos sobre os porquês de nomes de bandas, poesias, filmes, pessoas, entre outras coisas. Nossa mente clama por conhecer as razões que fazem com que as coisas existam. Nem mesmo as palavras escapam: buscamos a origem de suas partes e os motivos pelos quais elas estão ali. Obviamente, a compreensão da etimologia das palavras nos dá segurança em relação ao seu uso e agrega qualidade ao nosso ato de escrever ou ler. Semelhantemente, saber a origem do que diz respeito às coisas da vida poderia ajudar-nos a melhorarmos nossa relação com o mundo. Então, talvez, seja interessante devanear um pouco sobre o que levou à escolha do título “Uma História Pessoal”. É bem simples, viagem pouca.

Após regressar a Porto Alegre, após um fim de semana no interior com a família, estava eu pulando os canais da televisão procurando por algo interessante em um gélido domingo à noite. Minha expectativa era parva, não esperando encontrar nada além do típico entretenimento brasileiro: quaisquer comentários futebolísticos sobre a rodada do campeonato nacional, algum quadro no Fantástico mostrando a malandragem e a felicidade do cidadão dito “comum”, algum pastor dessas igrejas evangélicas vendendo o milagre de deus a um preço do diabo ou quem sabe algum filme clássico que começasse da seguinte maneira: “distribuição, VTI-Rio” (poderia ser também Álamo ou Herbert-Richards). De fato, a programação era bem a que eu imaginava, à exceção de uma entrevista feita por jornalistas despreparados com um brasileiro pouquíssimo conhecido chamado Miguel Nicolelis, médico neurocientista professor na Universidade de Duke, nos Estados Unidos, e neurofisiologista do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. Por que ele estava sendo entrevistado? Resumidamente, o Dr. Nicolelis conseguiu transformar em código um número suficiente de potenciais de ação neuronais envolvidos no ato de um macaco pegar uma banana com um membro superior e enviar esse código sob forma de radiação eletromagnética dos Estados Unidos ao Japão, onde tal informação foi receptada por um robô que imitou o movimento do primata, ou seja, ele desenvolveu um método que pode “ler” e reproduzir um comando cerebral. Era muito aprazível, então, a presença desse cidadão brasileiro na televisão de domingo à noite. Ia-se desenrolando a entrevista, quando o cientista foi questionado sobre sua opinião acerca da existência de deus. Como é difícil defender uma posição com argumentos racionais em relação a algo que não se percebe com os sentidos ou com a ajuda da tecnologia, ele limitou-se a dizer que não acreditava, lançando, após, um raio de luz nessa turbulenta temática com uma opinião bem interessante: o mundo, e a nossa vida, nada mais são do que uma história a nós contada pelo nosso próprio cérebro, e, já que toda história tem um começo, pode ter sido conveniente para nossas fragilidades colocar a figura de um pai criador que de tudo é consciente como um motivo primeiro para tudo isso que presenciamos acontecer. Fiquei com isso na cabeça. Comecei a imaginar minha vida como um livro escrito diariamente, cujas páginas tentam pôr ordem ao caos do universo, fazendo-me perceber as pessoas e suas atitudes e a natureza e seus fenômenos como objetos que situam-se em algum lugar próximo ao centro do meu ser, ou seja, a vida é como ela precisa parecer para que eu viva com algum conforto. Isso de forma alguma tira o encanto do viver, como pode parecer. O que parece mais claro é que devemos ficar atentos em relação a quão equivocados podemos estar em relação a alguma percepção, por mais confortadora que ela nos pareça – isso é importante quando queremos difundir nosso saber. Porém, como mecanismo de auto-defesa, essa concepção nos dá idéia do quanto podemos cair em intermináveis devaneios, apenas para melhorarmos as coisas para nós – o que, como escrito no texto anterior (“Psiquiatria Cosmológica”), pode resultar em fatos muito positivos para toda a humanidade, como uma música, um livro ou uma descoberta científica de impacto. Não é aterrorizante pensar que somos um filtro para o que os sentidos têm a capacidade de perceber, afinal nosso cérebro constitui nosso ser, logo temos a capacidade de regular esse filtro. Este não limita o alcance do que podemos conhecer, apenas organiza de uma forma inteligível e emocionalmente viável.

Então, esse blog é apenas minha visão pessoal do mundo, pois não há algo que me possa fazer ir além disso. Queria eu ter empatia suficiente para entender o mundo dos amigos, dos familiares, dos pacientes, mas o máximo que me parece possível alcançar é um reconhecimento de que minha visão das coisas é apenas aquela que aprendi a estruturar para minha personalidade não se desintegrar, podendo, a partir daí, abrir de forma gradual e eterna enquanto durar minha vida – para jamais abrir por completo - as pesadas portas da percepção.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Psiquiatria Cosmológica

Não raramente, encontro-me olhando para as estrelas e para os invisíveis mundos que nelas erram em trajetória elíptica tentando minimizar meus problemas aqui na Terra. Esse universo misterioso, com quase incontáveis sóis formando quase incontáveis galáxias, cada qual separada da vizinha mais próxima por um vazio intransponível por qualquer meio conhecido a ponto de ter suas maravilhas relatada para uma próxima geração, gera uma contemplação que parece reduzir a importância da nossa existência – ao menos, nossa insignificância racionalizada nos parece capaz de atenuar nossas ansiedades. Não sei se todos tentam aliviar suas tensões olhando para o céu, mas é universal a presença dos problemas nas nossas vidas, cada um lidando com eles à sua maneira.

Parece óbvio que não há mínima comparação possível entre um prazo estreito para estudar para uma prova aparentemente difícil na faculdade ou entre um momento financeiramente adversos e o tamanho desse universo que conhecemos. Só como exercício, podemos atrever-nos a fazer algumas pouco justas comparações: o que significa estudar muito para tirar a melhor nota ou ganhar o melhor salário entre os colegas conhecidos de profissão se levarmos em conta um sistema solar assombrosamente enorme, com um sol que é somente um entre cem bilhões em apenas uma galáxia, que contribui com uma unidade para um total de cem bilhões de galáxias em nosso universo observável? Isso aparentemente deveria sanar nossas angústias, mas nem sempre funciona. De fato, parece que nossa percepção e capacidade de contemplação com maravilhamento daquilo que observamos é ofuscada pelas nossas emoções. Planejamos surpreender-nos com o cosmos, mas o que nos faz buscar esse belo sentimento de pequenez bloqueia o sucesso de nossa empreitada. O homem parece, pois, preso na percepção involuntária do mundo desencadeada pelo seu afeto.

À primeira vista, parece claro que o melhor a se fazer para evitarmos esse problema seria cuidarmos com muito esmero dos nossos atos, dos nossos momentos de lazer e da forma como encaramos nosso aprendizado, tudo para evitar emoções desagradáveis. Assim, não teríamos uma cognição presa pelas correntes da subjetividade dos sentimentos humanos. Porém, pela mesma lógica não teríamos um porquê para olhar para o céu querendo aliviar o peso de importância que possuem nossos problemas, afinal tudo sempre estaria em paz. Parece claro que o impulso humano de olhar um pouquinho adiante ao nosso ordinário mundo cotidiano nasce de uma preocupação muitas vezes egoísta e individual, um problema meramente pessoal, mas que simplesmente o ato de buscar um significado maior para o fenômeno da vida e menor para os nossos demônios internos pode fazer brotar coisas de grande valor para toda a humanidade. Imagino Charles Darwin navegando pelos oceanos, Michael Faraday em noites acordado no laboratório, Wilhelm Röntgen encantando-se com os raios-x em um dia de inverno, Albert Einstein saindo do escritório de patentes em Berna imaginando-se viajando ao lado de um raio de luz ou Villa-Lobos compondo uma Bachiana após um dia navegando por algum afluente perdido do Rio Amazonas, todos buscando algo que valesse mais a pena do que as pequenas ansiedades do dia-a-dia e que confortasse a eterna calma tristeza de se saber apenas um humano.

Eu escrevo isso porque há pouco estava vendo as estrelas aparecerem após ventos fortes e contínuos carregarem para longe as nuvens que cobriram o céu pelo dia inteiro. Não era só a presença desses sóis que eu buscava, era, antes de tudo, um motivo para não sucumbir às pressões da vida profissional, um meio para dar luz àquilo que talvez haja de mais precioso em nossa relação com o mundo e com as pessoas: o encanto com o universo que percebemos e o sentimento de empatia e solidariedade que temos com os outros quando percebemos que estamos na mesma situação, vivos sem algum motivo especial e buscando uma explicação para esse absurdo, mesmo que de eficácia parcial. E, de fato, as soluções são fugazes. Por exemplo, posso agora ver um valor no conteúdo deste texto ou simplesmente no ato de escrevê-lo, mas amanhã posso lê-lo ao acordar e não descartá-lo somente por que eu próprio o escrevi. Não importa agora, afinal o que vale é que hoje dormirei melhor.